quarta-feira, 7 de maio de 2008

Movimento Segurança Cidadã - BI nº 2

EDITORIAL


Entre os anos de 1955 e 1975, período de maior desenvolvimento industrial na história do Brasil, a sociedade brasileira passou por um processo transformação raramente visto nas sociedades contemporâneas. Em apenas vinte anos, o Brasil passou da condição de sociedade rural, sedimentada em bases agrárias para se tornar um modelo de sociedade urbana, sedimentada em bases industriais.

No final da década de sessenta e início da década de setenta, por exemplo, o boom da construção civil, contribuiu sobremaneira para a ocorrência de altas taxas de migração do campo para a cidade. Nesse período a população do campo migrava para as grandes metrópoles, dentre elas o Rio de Janeiro, em busca de melhores condições de vida.


Todavia as grandes cidades não estavam preparadas para absorver essa mão de obra. As condições de infra – estrutura e serviços eram extremamente precárias. Esse processo migratório permaneceu ativo e perdurou até a década de oitenta, o que concorreu, direta e indiretamente, para o crescimento desestruturado das cidades.

As sucessivas demonstrações de omissão e permissividade do Poder Público promoveram a ocupação irregular do solo urbano e a inadequada e insuficiente provisão de serviços públicos essenciais em face do aumento da demanda. Enfim, desde aquela época até os dias de hoje vive-se um verdadeiro caos urbano.

É nesse cenário conflituoso que os conglomerados urbanos ou favelas se expandiram. As favelas são ambientes geográficos informais, situados topograficamente nos morros da cidade, o que impede um controle periférico da criminalidade.

Marcadas pela ausência total ou parcial do Estado, os moradores das comunidades populares do Estado do Rio de Janeiro constituem o principal grupo de vítimas da violência e da criminalidade. As favelas se tornaram locais ideais para a prática criminosa e para o homizio de marginais da Lei, sobretudo àquelas práticas associadas à dinâmica do tráfico de drogas associado ao contrabando de armas.

Por outro lado, ao longo das últimas décadas, acima referenciadas, as organizações policiais não prepararam adequadamente para enfrentar o futuro. Em 1964, no âmbito da segurança pública, ocorreu uma grande mudança conceitual. O foco deixou de ser a segurança do cidadão e passou a ser a segurança do Estado. O inimigo interno passou a ser o principal alvo das organizações policiais.

O ideário da doutrina de segurança nacional transformou as polícias militares em forças policiais – militares ordinárias de segurança pública com responsabilidade exclusiva pela ação de polícia ostensiva e de manutenção da ordem pública.

Nesse contexto, prevaleceu o modelo de organização policial baseado no paradigma militarista onde a idéia de serviço estava necessariamente subordinada à idéia de força. Esse processo de militarização da segurança pública ensejou uma série de conseqüências para a administração do serviço policial.

É conveniente destacar que não foi o modelo de estrutura organizacional herdado do exército, baseado em princípios sólidos de hierarquia e disciplina que viciou esse processo, mas sim a ideologização do modelo aplicado a uma dinâmica de prestação de serviços de segurança pública que desvirtuou a finalidade e os objetivos institucionais básicos que devem nortear o bom funcionamento uma organização policial.

Grosso modo, enquanto as favelas se expandiam e o crime organizado tomava corpo e forma, as organizações policiais centravam seus esforços no estouro de aparelhos subversivos e na repressão às manifestações populares pró – democracia. O foco estava concentrado no inimigo interno e não na administração policial da ordem pública com vistas a uma efetiva prestação de serviços de segurança pública objetivando a melhoria da qualidade de vida da população.

Outro ponto de destaque refere-se ao modelo de administração adotado pela Corporação, extremamente fechado, partilhado e mecanicista, totalmente avesso ao relacionamento institucional participativo e frontalmente incompatível com a dinâmica imposta pelo ambiente nos diferentes processos de interação que são exigidos no âmbito dos serviços policiais.

Um claro exemplo dessa triste realidade pode ser buscado na própria dinâmica da criminalidade: enquanto nas organizações criminosas as atividades são organizadas através de redes ágeis, nas organizações policiais persiste o velho esquema de organização baseado no modelo piramidal, fechado em si mesmo, desconectado das instituições afins e do próprio ambiente, interno e externo.

As sociedades contemporâneas que apresentam expressivos indicadores e taxas de violência e de criminalidade são, via de regra, marcadas por um acentuado nível de desigualdade social e falta de acesso à justiça. Aliado a esse fator, as sociedades contemporâneas cultuam o consumismo, em todos seus aspectos, dimensões e manifestações, como valor social de primeira grandeza. Nesse contexto, é comum observar uma forte contradição entre os valores tradicionais e os valores da modernidade.

Essa realidade, principalmente nos países subdesenvolvidos como o Brasil, determina o marco etiológico que caracteriza o agravamento do processo de exclusão social.

Entre 1980 e 2002, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, ocorreu um aumento de 85% na taxa de homicídios atingindo um valor de 60 por 100 mil habitantes. Como principal conseqüência dessa dinâmica assistimos inertes ao extermínio de nossa juventude. Crianças desprovidas de um mínimo de estrutura familiar são facilmente cooptadas para as atividades criminosas. Ganham visibilidade perante o mundo portando armas de alto poder bélico.

Nesse sentido, a violência e a criminalidade no Brasil associada à dinâmica do tráfico de drogas tem território específico, idade, sexo e cor. Ocorre nas favelas, nos conglomerados urbanos e na periferia desses espaços geográficos, seus principais algozes e vítimas são jovens do sexo masculino, com idade compreendida entre 13 e 24 anos, na sua maioria negros.

Um estudo recente do Banco Mundial (2006) estima que uma redução de 10% na taxa de homicídios no Brasil poderia contribuir com uma elevação entre 0,2 e 0,8 pontos percentuais ao ano da taxa de crescimento de renda per capita ao longo dos próximos cinco anos.

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