terça-feira, 6 de maio de 2008

Ponto de Vista - Valorização do Profissional de Segurança Pública

VALORIZAÇÃO DO PROFISSIONAL E QUALIDADE DO SERVIÇO
A ASCENSÃO FUNCIONAL E INEFICIÊNCIA OPERACIONAL DA PMERJ

Coronel de Polícia RR Alexandre Carvalhães Rosette

1. Assunto

A ascensão funcional na carreira policial militar, também denominada Plano de Carreira, tem suscitado recorrentes indagações no âmbito interno quanto as suas premissas.

O senso comum, o qual conta com a simpatia de parcela significativa dos integrantes dos diversos escalões hierárquicos, é solidário a uma política inclusiva e protecionista, cujo foco é o indivíduo policial militar; uma política de cunho social e humanitário.

Outra parcela, menos numerosa na Corporação, argumenta o contrário, ou seja, que a carreira policial militar está enfraquecida e deveria fortalecer-se com base nas premissas alinhadas com a nova revolução que se impõe neste terceiro milênio – a Revolução do Conhecimento e da Capacitação – cujo lócus mais visível reside na habilitação profissional como requisito para a ascensão funcional.

Diante do paradoxo oferecido pelas duas correntes de pensamento acima, o pesquisador buscou oferecer alternativas para avaliação por parte dos gestores institucionais, o qual através do oferecimento de um sumário possa, ao final, apresentar uma proposta que se mostre enquadrada nos princípios da ADEQUABILIDADE, EXEQUIBILIDADE e ACEITABILIDADE permitindo a melhor decisão institucional por parte dos tomadores de decisões.

2. O Problema

O Decreto Estadual nº 22.169 de 13 de maio de 1996 instituiu na Corporação as promoções de praças por tempo de serviço. A nova legislação, de cunho inclusivo, gerou uma demanda de promoções às graduações de cabo, 3º, 2º e 1º sargentos e subtenente PM que culminaram num excedente em todos os níveis hierárquicos do QPMP-0.

Tal fato vem ocorrendo, de forma cumulativa, desde 1996 em virtude de este Decreto haver modificado o inciso I do Art. 11 do Decreto nº 7.766 de 28 de novembro de 1984 (o Regulamento de Promoção de Praças – RPP) no que concerne ao requisito para a promoção à graduação superior, qual seja, a conclusão com aproveitamento, à época da constituição dos QAA e QAM, dos cursos de habilitação existentes até então na Corporação – CFC, CFS, CAS e CASAS.

Em síntese se pode concluir que a promoção por tempo de serviço, pura e simplesmente, em detrimento da anterior qualificação da praça em curso de formação ou aperfeiçoamento, gera uma desqualificação profissional do graduado, mesmo que a posteriori , como se verificou, venha este a ser matriculado nos Cursos Especiais de Formação que foram criados em face da nova legislação.

Do exposto o pesquisador IDENTIFICA o problema como sendo o excedente de graduados nas diversas escalas hierárquicas constantes de um Demonstrativo do Cômputo de Vagas e as demais variáveis supervenientes que o presente estudo pretende apresentar.

3. Fatos que conduzem ao problema

a. Origem

À primeira vista a origem do problema sinaliza para o Decreto nº 22.169 de 13/05/96, entretanto a naturalização de conceitos é danosa no processo de tomada de decisões.

O viés de se adotar idéias pré-concebidas divorciam o gestor administrativo do verdadeiro papel do Comandante, sintetizado dessa forma pelo Cel PM Paulo Roberto de Aguiar Portela (1990):


“Comandar é, principalmente, tomar decisões. O Comandante deve comparar a tomada de decisão a um ICEBERG, onde a parte visível corresponde ao seu conhecimento dos fatores envolvidos no processo decisório, representando a parte submersa tudo aquilo que desconhece, mas que vai influir sobre o sucesso ou não do processo.”


Diante desse cenário, um Estado Maior deve elaborar o estudo visando esgotar todas as suas variáveis a fim de mostrar ao Comandante todo o “iceberg” e sinalizar para uma alternativa que se encaixe nos três princípios: ADEQUABILIDADE, EXEQUIBILIDADE e ACEITABILIDADE.


Para o atingimento desse produto final, compete a um Estado Maior:

  • Estudar os problemas relacionados com a organização, sua missão e os objetivos a atingir;
  • Reunir e preparar todos os elementos à concepção e formulação das políticas, diretrizes, planos e ordens do Comandante;
  • Providenciar todos os elementos necessários para que o Comandante possa julgar o problema e tomar uma decisão;
  • Por em prática políticas, diretrizes, planos e ordens do Comandante;
  • Assegurar a transmissão e difusão das decisões do Comandante, e;
  • Orientar, coordenar e controlar todas as atividades fundamentais da organização.

Perseguindo estes fundamentos o pesquisador partiu da pesquisa documental comparativa e das diversas entrevistas pessoais realizadas com ex-Chefes da Seção de Promoções da Diretoria Geral de Pessoal (DGP / SP), cuja discussão passa a expor.

b. Critérios

“Quem decide pode errar. Quem não decide já errou”. Herbert Von Karajan.

O confronto do Decreto nº 22.169 de 13/05/96 com o anterior Decreto nº 7.766 de 28/11/84 apontou uma das causas do excedente verificado no Quadro Demonstrativo do Cômputo de Vagas, entretanto isto não é tudo.

Subjacente a este problema, e de acordo com a consulta realizada na DGP / SP, verificou-se a desqualificação gradativa a partir de 1996 dos graus hierárquicos de cabo, sargento e subtenente.

É evidente nos dias atuais nos depararmos com graduados exercendo funções subalternas, antes atribuídas a soldados e cabos, como: motorista, faxina, plantão de rancho, guarda do quartel (sem ser o comandante da mesma), patrulheiro, POG, etc.

A Corporação tem sua estrutura vertebrada na hierarquia militar, conforme preconizado no Estatuto dos Policiais Militares; o Regulamento Interno e dos Serviços Gerais (oriundo do Exército Brasileiro) tem aplicação na Corporação numa gama de funções inerentes à natureza militar dos serviços administrativos e vinculados a atividade-meio, sendo, portanto, o aproveitamento desses profissionais nas funções descritas anteriormente uma forma de subemprego dessa mão de obra, ocasionada certamente pela desqualificação individual e pelo excesso de graduados em detrimento de soldados, que o atual Plano de Carreira não previu.

Ocorre que a Corporação ao privilegiar as promoções por tempo de serviço em detrimento daquelas ocorridas pela habilitação profissional provocou a desmotivação do efetivo na busca pela qualificação.

É bem verdade que não cabe à Polícia Militar deixar de cumprir o Decreto Estadual que a instituiu (promoção por tempo de serviço), contudo, fundamentando uma proposta ao Poder Executivo estadual com base num Planejamento Estratégico, que venha a comprovar uma perda de qualidade nos serviços policiais por conta de uma política pública canhestra, há que se buscar uma solução mais adequada para fazer frente às necessidades de transformação que a sociedade do Rio de Janeiro exige de sua polícia.

A busca pela qualidade nos serviços é o fundamento de toda a discussão política nessa nova era da informação. Enquanto as empresas, públicas e privadas, buscam aprimorar e qualificar seu quadro de funcionários e, ao mesmo tempo, rejeitam aqueles que são refratários à evolução pelo conhecimento, não pode a Polícia Militar, defensora da sociedade e instituição da linha de frente do Estado pelos direitos humanos e controle social, dar esse passo gigantesco – para trás – sob pena de ter seu papel social questionado e passar a sofrer toda sorte de ataques, até mesmo pela sua extinção ou substituição, o que parece evidente hodiernamente.

Conclusivamente, para que os fatos fiquem bem delineados e claros para uma decisão, o pesquisador passará a apresentar a discussão das linhas de ação surgidas neste estudo.

4. Discussão

Linha de Ação nº 1:
Proposta ao Exmo.sr. Governador do Estado do Rio de Janeiro de revogação do Decreto Estadual nº 22.169 de 13/05/96, fundamentando minuciosamente o alcance de tal medida e retroação a condição anterior, qual seja, tratamento da questão pelo Regulamento de Promoção de Parcas (RPP).

Linha de Ação nº 2:
Manutenção da atual legislação, reformulando o ensino na Corporação a fim de qualificar de forma equânime os cursos regulares e os especiais de formação e aperfeiçoamento de praças.

Linha de Ação nº 3:
Elaboração de abrangente Planejamento Estratégico que vise não somente gerar uma proposta ao Executivo Estadual de revogação da atual legislação, como também, internamente, reformular os currículos de todos os cursos de formação e aperfeiçoamento (Oficiais e Praças) adequando-os à 3ª Revolução Industrial (a Revolução do Conhecimento).

Análise das Linhas de Ação:

  • Vantagens da Linha de Ação nº 1
    · Fácil argumentação
    · Medida de curto prazo *

  • Desvantagens da Linha de Ação nº 1
    · Politicamente impopular no âmbito interno;
    · Reduzido alcance;
    · Medida de curto prazo *;
    · Previsível entrave jurídico;
    · Resistência às mudanças.

  • Vantagens da Linha de Ação nº 2
    · Medida de âmbito interno;
    · Solução somente pela qualificação;
    · Previsível geração de motivação profissional;
    · Conseqüente melhoria na prestação dos serviços.

  • Desvantagens da Linha de Ação nº 2
    · Não resolve o problema dos excedentes nos quadros;
    · Não soluciona o baixo aproveitamento da mão de obra nas funções subalternas;
    · Transfere a resolução do problema para o futuro;
    · Pressupõe o rebaixamento da praça sem aproveitamento ao final do curso especial;
    · Maior custo financeiro;
    · Resistência às mudanças.
  • Vantagens da Linha de Ação nº 3
    · Efetividade da medida;
    · Impulso de qualidade na prestação dos serviços;
    · Sintonia com os avanços sociais e tecnológicos;
    · Formação de uma nova identidade policial – pela qualificação;

  • Desvantagens da Linha de Ação nº 3
    · Produção de efeitos em longo prazo *;
    · Politicamente popular e inovadora.
    · Produção de efeitos em longo prazo; *.
    · Demanda por investimentos financeiros superiores aos atuais;
    · Resistência às mudanças.

OBSERVAÇÃO: * variáveis ambivalentes

5. Outras Considerações

“Para se chegar onde quer que seja não é preciso dominar a força, basta controlar a razão.”
Amir Klink

É inegável a transformação da sociedade verificada, principalmente, a partir do final do século XX e neste início do século XXI. Tais mudanças provocam reações as mais diversas no seio social, da mesma forma que provocaram a 1ª Revolução Industrial – do ferro e do carvão – na Inglaterra e França do século XIX e na Europa e EUA no início do século XX pela 2ª Revolução Industrial – do aço, do petróleo e do automóvel.

Verificamos diariamente grandes corporações ruírem quase que instantaneamente e resta-nos perguntar: como?

Em contrapartida vemos empresas jovens que crescem a proporções geométricas e a mesma pergunta nos assombra.

A resposta está em algo invisível, imensurável, mas que de forma alguma deve ser encarado como inexistente. Vivemos na era da 3ª Revolução Industrial, a Revolução do Conhecimento.

Todas as corporações sejam elas do setor público ou privado, que resistam em enxergar tais transformações e/ou não consigam se adaptar a elas estarão fadadas ao fracasso e à ruína.

Na sociedade do conhecimento a informação ganha status de recurso econômico, onde o intelectual produz um bem imaterial, mas de grande valor financeiro, segundo Peter Senge[1].

Uma moderna organização de segurança pública deve, hodiernamente, questionar:

Qual é o nosso negócio?

Quem são os nossos clientes?

A Polícia Militar, através da aplicação da atual política de gerenciamento de recursos humanos, parece estar ancorada na 2ª Revolução Industrial. Seus métodos “TAYLORISTAS” de avaliação da produtividade adquirem enxertos socialistas como se vivêssemos ainda sob o manto do Estado – Provedor, de cunho social e humanitário, quando efetivamente esta não é a realidade.

Em verdade, vivemos numa sociedade de mercado, na era da informação, cujo lócus mais visível está na Internet.

O problema estudado no presente artigo, que embora possua cunho informativo, é real e está formando uma massa crítica que poderá levar à implosão institucional pela vertente da sua ineficiência operacional. Basta ver os volumosos e diários questionamentos que a Corporação sofre quanto a sua capacidade e qualificação em defender a sociedade diante de uma onda de violência que extrapola os parâmetros suportáveis no nosso Estado, e em particular na cidade do Rio de Janeiro.

É uma visão muito simplista imaginar-se que o problema pode ser resolvido com POLÍCIA, ou pior, com mais POLÍCIA (contratando MAIS policiais). O discurso de que precisamos aumentar a quantidade é falacioso, além de ser oneroso. Um estudo mais aprofundado da questão irá remeter-nos a uma outra visão do problema: romper paradigmas, transformação pelo ensino, preparação de gestores qualificados, utilização ampla de modernas tecnologias de informação e comunicação, identificação e acompanhamento periódico das necessidades dos clientes e a rápida adaptação à nova demanda pela tomada de decisão em tempo real.

Estes são alguns dos principais desafios que se impõe a Polícia Militar neste 3º Milênio.

A questão proposta para o presente artigo foi clinicamente radiografada, e ao fazê-lo o pesquisador verificou que a questão – promoção de praças – é a ponta de um “iceberg”. É a parte visível da crise institucional que vive a Corporação com reflexos nocivos à sua perpetuação; e não podemos conceber que existam seres de uma mesma ‘espécie’ contrários a sua própria preservação.

De tudo isso se buscou extrair da obra de Garvin[2] o conceito de qualidade através da implantação do programa operacional denominado Zero Defeito (p. 20):


“A razão que explica a falta de perfeição era simplesmente que não se esperava a perfeição. Quando a gerência passou a exigir a perfeição – conseguiu-a!”


“A contribuição desta consistiu, basicamente, na articulação de uma filosofia – de que o único padrão de qualidade aceitável era zero defeito – e em mostrar como os empregados poderiam ficar imbuídos dela através do treinamento, de eventos especiais, da divulgação de resultados relacionados com a qualidade, do estabelecimento de metas e da realimentação pessoal.” [grifo nosso]


6. Proposta

Da análise qualitativa das variáveis de todas as linhas de ação apresentadas, o pesquisador indica a adoção do modelo três pela sua efetividade, atualidade, exeqüibilidade e aceitabilidade.

A questão da política de pessoal, em se tratando de Polícia Militar, não está dissociada da questão da qualificação profissional, pois o produto da organização é o homem, preparado, motivado e qualificado. Relembrando uma afirmação do extinto Cel PM Carlos Magno Nazareth Cerqueira:

“Temos que trabalhar com muita dedicação e obsessão para criar condições para a implantação de uma nova polícia e um novo policial, que entendesse que o controle do crime se faz em parceria com a comunidade e de forma pro ativa e inteligente, isto é, buscando sempre prevenir para não ter que reprimir, e quando reprimir fazê-lo com discernimento e inteligência.”.


[1] Senge, Peter – The Fifth Discipline: The Art and Practice of the Learning Organization, in http://www.janelanaweb.com/


[2] Garvin, David A. – Gerenciando a Qualidade – A visão estratégica e competitiva, 2002, Ed. Qualitymark.

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