segunda-feira, 2 de junho de 2008

Relatório da Anistia Internacional 2008.

Trechos Selecionados

Os moradores das comunidades marginalizadas continuaram a viver em meio a níveis extremamente elevados de violência, praticada tanto por grupos criminosos organizados quanto pela polícia.

As operações policiais realizadas nessas comunidades resultaram em milhares de mortos e de feridos, geralmente intensificando a exclusão social. Grupos de extermínio ligados à polícia também foram responsáveis por centenas de assassinatos.

O sistema de justiça criminal falhou em seu dever de fazer com que os responsáveis por abusos prestem contas de seus atos. Infligiu ainda uma série de violações de direitos humanos às pessoas detidas em suas prisões e centros de detenção juvenis, superlotados e exauridos de recursos.

Polícia e Serviços de Segurança

As comunidades carentes continuaram encurraladas entre as gangues de criminosos que dominam as áreas em que elas vivem e os métodos violentos e discriminatórios usados pela polícia. Em conseqüência disso, muitos dos que moram nessas comunidades vivenciaram intensas privações sociais e econômicas.

A resposta do governo federal e dos governos estaduais à violência criminal foi confusa. O governo federal lançou o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), voltado à prevenção do crime, à inclusão social, à reabilitação de prisioneiros e à melhora dos salários dos policiais.

Entretanto, apesar dos relatos abundantes de violações de direitos humanos cometidas pela polícia, o Presidente Lula e outras autoridades de seu governo apoiaram publicamente certas operações policiais militarizadas de grande repercussão, especialmente no Rio de Janeiro.

Nos estados, apesar de alguns governadores terem prometido reformas, a maioria das forças policiais estaduais continuou a adotar métodos violentos, discriminatórios e corruptos no combate e na repressão ao crime nas comunidades carentes, com escassa supervisão ou controle.

Em nenhum outro lugar isso foi tão evidente quanto no Rio de Janeiro, onde as promessas de reforma foram abandonadas e o governador passou a adotar uma postura pública cada vez mais draconiana e belicosa nas questões de segurança. A política de realizar operações policiais militarizadas de grande escala foi intensificada à custa de centenas de vidas.

Segundo dados oficiais, a polícia matou ao menos 1.260 pessoas no estado em 2007 – o maior número até agora. Todas as mortes foram classificadas como "resistência seguida de morte" e tiveram pouca ou nenhuma investigação séria.

Houve dezenas de mortes e uma enorme quantidade de feridos durante as operações policiais realizadas no Complexo do Alemão –um aglomerado de 21 comunidades socialmente excluídas, na zona norte do Rio de Janeiro, onde vivem mais de 100mil pessoas – e na vizinha Vila da Penha.

Milhares de pessoas tiveram de enfrentar o fechamento de escolas e de postos de saúde, bem como cortes no fornecimento de água e de energia elétrica. Durante as operações, houve denúncias de execuções extrajudiciais, espancamentos, vandalismo e roubo cometido por policiais.

Membros da comunidade disseram que um veículo blindado da polícia (o caveirão) era usado como uma unidade móvel dentro da qual os policiais aplicavam choques elétricos e praticavam espancamentos.

A ação repressiva culminou com uma "mega-operação", realizada no final de junho, envolvendo 1.350 policiais civis e militares e membros da Força Nacional, a força de elite do governo federal. A polícia matou ao menos 19 supostos criminosos, um deles com 13 anos de idade, e dezenas de transeuntes foram feridos.

Foram apreendidas 13 armas e uma quantidade de drogas. Ninguém foi preso. A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio de Janeiro, e a Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo federal declararam que investigações independentes dos relatórios forenses oficiais apontaram fortes indícios da ocorrência de execuções sumárias.

O relator especial da ONU sobre execuções sumárias, arbitrárias ou extrajudiciais, que visitou o Rio de Janeiro em novembro, criticou a falta de investigações oficiais sobre os assassinatos e concluiu que a operação teve motivação política.

Em outubro, uma operação da Polícia Civil na favela da Coréia, em Senador Camará, zona oeste do Rio, deixou 12 mortos:um menino de quatro anos,que teria sido atingido por fogo cruzado, um policial e 10 "suspeitos", um deles de 14anos.

Imagens aéreas exibidas pela televisão em rede nacional mostraram dois homens tentando fugir do local enquanto eram alvos de tiros disparados de um helicóptero que os seguiu até serem mortos.

Milícias parapoliciais, formadas por policiais e bombeiros fora de serviço, continuaram a dominar uma grande parte das favelas do Rio de Janeiro.

Em abril, Jorge da Silva Siqueira Neto, presidente da Associação de Moradores da Favela Kelson's, na Penha, dominada pelas milícias, foi obrigado a abandonar o bairro após receber ameaças de morte.

Ele acusou cinco policiais militares de terem assumido "poderes ditatoriais" dentro da comunidade e fez denúncias à Corregedoria da Polícia, à Secretaria de Segurança Pública e ao Ministério Público. Três dos policiais foram detidos administrativamente, sendo soltos em seguida, no início de setembro.

Quatro dias depois, Jorge da Silva Siqueira Neto foi morto a tiros. Um inquérito foi aberto, mas até o fim do ano não havia progressos.

Nota da Secretaria de Segurança

No fim da tarde desta quarta-feira (28), a Secretaria de Segurança Pública também divulgou nota oficial rebatendo as críticas do relatório da Anistia: "A Secretaria de Segurança assegura que não existe política de confronto no Rio. O que há é uma política de desarmamento do tráfico para que o carioca recupere seu direito de ir-e-vir. Moradores de comunidade pobres também pagam imposto e têm direito à segurança pública e não de viver sob o domínio de bandidos. Quanto a mudanças nas polícias, dois grupos de trabalho, coordenados pela secretaria, estão discutindo propostas para melhorias nas polícias Civil e Militar", afirma o documento.

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