Cabral reafirma confronto ao crime e sociólogos criticam política
Júlia Moura e Ludmilla Rabello, JB Online
RIO - Após o assassinato de dois policiais militares que faziam patrulhamento na Lagoa, na Zona Sul do Rio, na madrugada desta quinta-feira, e de uma sucessão de eventos que culminaram na morte de civis durante ações policiais, o governador Sérgio Cabral reafirmou, nesta quinta-feira, que a política de segurança pública do enfrentamento não vai mudar. Cabral disse também que não haverá trégua, e que não pode aceitar que um marginal atire num policial sem que a polícia reaja .
– Nossa política não tem recuo. Tratar nossos policiais como vilões é ruim para a própria sociedade. E quem acha que pode enfrentar bandidos fortemente armados, com fuzis e granadas, apenas com discurso está equivocado. Vamos combatê-los sempre. Eles sabem que o jogo mudou. Estamos apreendendo drogas e armas como nunca aconteceu no estado e então procuram reagir. Mas não terão trégua – assegurou, durante cerimônia de entrega de novas viaturas da PM, no Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças, em Sulacap.
Rio vive 'situação de guerra'
Para a socióloga Alba Zaluar, o desabafo do pai de João Roberto Amorim, de 3 anos, morto a tiros durante ação da polícia na Tijuca, na Zona Norte do Rio, há dez dias, resume a política de segurança atual:'O Estado não tem carta branca para matar ninguém'. Para ela, a polícia de fato está tendo licença para matar e o confronto quase diário tem aumentado o grau de estresse dos policiais.
- O problema não é o confronto, mas as táticas usadas. Quando policiais entram na favela e matam, é certo que terão reação oposta, e eles sabem disso. As pessoas passaram a resistir e os policiais entraram em pânico. Estão num estado de estresse que precisa de tratamento, o que explica o grande número de mortes durante as ações policiais, os autos de resistência. Já são quase 700 mortes só no primeiro semestre deste ano (502 mortes confirmadas pelo Instituto de Segurança Pública até março de 2008)– explica.
A socióloga também critica a posição do governador, que chegou a chamar policiais militares de débeis mentais. Para Alba, está instaurada no Estado do Rio uma 'situação de guerra'. Ela reforça a importância do tratamento psicológico aos policiais e diz que enquanto isso não acontecer a situação só vai piorar e as tragédias vão acontecer mais vezes.
- Dizer que eles são débeis mentais não vai resolver o problema, e reforçar o treinamento das tropas não terá efeito algum enquanto o governo não cassar a licença para matar. O policial também tem que aprender a respeitar o morador de favela, e o traficante, que não é para ser morto, mas preso e julgado. É essa licença para matar que faz com que policiais burlem as leis e passem a ser criminoso – afirma Alba.
A questão do tratamento para policiais e do investimento na formação das forças de segurança também foram abordadas pelo deputado estadual Marcelo Freixo (Psol), que é presidente da Comissão Parlamentar de Inquéritos destinada a investigar a atuação das milícias no Rio. Para ele, a falta de preparo esbarra na discussão orçamentária.
- Todo governo tem que combater o crime, mas para isso, tem que ter uma polícia preparada, bem remunerada e treinada para identificar o momento certo da ação. Só assim teremos controle social sobre a polícia. No governo atual, não há previsão de melhoria salarial até 2009. A polícia do Rio de Janeiro é a que mais mata e mais morre, o que é inaceitável e alarmante. O responsável por isso não é a Polícia Militar, e sim a política de segurança do governo, que manda combater a violência com mais violência – analisa o deputado.
'Uso da arma é o último recurso', diz sociólogo
Para o sociólogo Ruben Cesar Fernandes, da Ong Viva Rio, não é a política de Segurança Pública do Rio que provoca a violência e os conflitos armados, mas se o Estado não consegue interromper esse processo, não é capaz de produzir segurança pública. Segundo o sociólogo, é preciso difundir a mensagem que o uso da arma é o último recurso para a segurança.
- A seqüência de barbaridades mostra que tanto a polícia quantos os bandidos estão vivendo uma espécie de histeria coletiva, em que a principal mensagem é atirar. É uma dinâmica doentia, patológica. A polícia precisa se impor antes de sacar a arma. Quando acontece o tiroteio, a situação já está fora de controle. É preciso uma intervenção forte para coibir o uso das armas. É preciso isolar o confronto antes de generalizar – afirma Cesar.
Para o ex-secretário de direitos humanos, João Luiz Duboc Pinaud, a política de segurança precisa ser antes de tudo 'pública', e deve começar nas comunidades, onde o problema econômico se transforma em problema de polícia.
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